O mundo da acessibilidade digital é um universo incrível. É incansável se aprofundar nos conhecimentos, apreciar e buscar cada vez mais fazer parte dessa esfera que está à nossa volta – muitas vezes invisível, silenciosa, intocável, mas sempre assídua. Compreender que a diversidade existe é inquestionavelmente importante, mas fazer com que nos sintamos envolvidos e incluídos é uma questão de empatia, delicadeza e tato. Acessibilidade digital é se preocupar com o próximo, é facilitar a aproximação, o tratamento e a aquisição de conhecimento e cultura de forma sucinta e clara.
Não nos cansamos de tratar sobre esse assunto aqui, afinal, propiciar uma sociedade mais igualitária é o que buscamos em nossa profissão como tradutores, legendadores e possibilitadores desse universo, e saber que há pessoas que se preocupam em passar sua mensagem para aqueles que não podem contar apenas com os meios comuns de comunicação aquece o coração e mostra que essa medida tem um papel importantíssimo sobre nós enquanto sociedade.
Cultura
Por falar em cultura, um exemplo maravilhoso de medidas de acessibilidade e inclusão é a música. Ela é considerada por diversos autores como uma prática cultural e humana – sim, humana. Atualmente, não se conhece nenhuma civilização que não possua manifestações musicais próprias, e graças à tecnologia e à globalização, hoje a música pode ser mais inclusiva com o auxílio de vídeos e ferramentas digitais que possibilitam a audiodescrição, a tradução e a legenda descritiva, como no caso do projeto Mergulho, da cantora, compositora e atriz Luiza Caspary.
Luiza Caspary
Luiza Caspary nasceu em Salvador, no dia 12 de abril de 1989, e é conhecida por seus trabalhos pioneiros de acessibilidade a deficientes visuais e auditivos como artista brasileira e pela dublagem em português de jogos como The Last Of Us, em que dubla a personagem Ellie. Aliás, além da dublagem da personagem, Luiza, sempre envolvida com música, também anunciou um álbum e um curta inspirados em The Last of Us. Para saber mais, recomendamos a leitura deste artigo: Luiza Caspary, dubladora de Ellie, anuncia álbum e curta inspirados em The Last of Us.
Luiza também foi pioneira no território brasileiro ao criar um clipe musical com o recurso de audiodescrição e ter feito um show com o mesmo recurso. Em 2011, o clipe da Música “O Caminho Certo” também ganhou este recurso para que pessoas com deficiência visual pudessem ouvir as cenas e entender as imagens. Em 2012, em Porto Alegre, a artista levou a audiodescrição para seu show, descrevendo a si mesma, seu figurino, a banda e a distribuição dos objetos e acontecimentos no palco. A plateia de 300 lugares estava lotada e cerca de 10% do público tinha cegueira ou baixa visão. “O uso do recurso de audiodescrição fez com que todos se sentissem incluídos e pudessem se divertir de forma inclusiva”, afirma Luiza.
Mergulho
Alguns anos depois, em 2018, Luiza lançou o álbum Mergulho em conjunto com uma equipe especializada em acessibilidade que conta com a participação essencial de Naiane Olah, intérprete de Libras que participa integralmente dos vídeos acessíveis do disco. A ideia do trabalho é dar a mesma visibilidade e importância da artista à intérprete.
“Esse projeto de vídeo com a Língua Brasileira de Sinais foi muito diferente no meu trabalho. Eu quis sair do padrão da janela de Libras pequena, no canto da tela, como é habitual, e trazer para a frente da tela, com a mesma importância e evidência do artista e de sua voz”, diz Luiza em entrevista para o Blog Vencer Limites, do Estadão.
“Essa é a forma de comunicar à comunidade surda o que a letra da música diz. Pode ser que algumas pessoas achem estranho, mas espero que isso chegue a todos da melhor forma possível. Foi feito com muito amor e carinho, muita pesquisa e muita gente”, comenta a cantora.
O Projeto Doc Mergulho – Faixa a Faixa
Com o sucesso do álbum, Luiza decidiu criar um documentário, o Doc Mergulho – Faixa a Faixa. No primeiro vídeo da série de documentários da artista, intitulado “Documentário Mergulho – Introdução”, ela comenta que a produção do álbum “é uma realização de um sonho onde eu pude compartilhar com o mundo um disco não só pra se ouvir, mas pra se ver.”
Na sequência de vídeos, Luiza busca passar por cada uma das músicas do álbum explicando como foi a produção, as dificuldades, as possibilidades, as ideias e, principalmente, os sentimentos que envolveram o projeto. É um trabalho de afeto, de empatia, de envolvimento e aproximação. Como ela mesma pede, “mergulhem comigo também” – e foi isso que nossa equipe buscou ao participar tão profundamente da legendagem dos vídeos do documentário.
Tivemos a honra de participar deste tão profundo e maravilhoso “Mergulho”. Este foi um daqueles projetos que entra em nossa vida e em nosso coração. Inclusive, parabéns pelo lindo trabalho de toda a equipe envolvida. O projeto foi de uma profundidade e de um sentimento enorme.
Assistir aos vídeos e se colocar, de certa forma, na pele do público que o projeto tenta alcançar foi uma experiência única. Como não portador de deficiência visual ou auditiva, reproduzir os vídeos para tentar entender melhor como é estar na pele de quem tem a necessidade de acessibilidade nos conteúdos digitais muda totalmente a forma de como “vemos” as coisas.
Inclusive, deixamos aqui uma sugestão: se você também não é portador de deficiência visual ou auditiva, reproduza os vídeos apenas com as imagens, sem som; depois, apenas com o áudio, sem as imagens.
A primeira coisa que podemos perceber é que o “Mergulho” é vivo. Ao reproduzir o vídeo de olhos fechados, por exemplo, a audiodescrição é essencial para a compreensão das cenas e traz informações importantes onde a imaginação pode fluir e compor o ambiente de maneira inesperada. Ao reproduzir o vídeo de olhos abertos, mas sem som, mesmo sem saber interpretar Libras, o uso da legenda é essencial para a compreensão de tudo o que acontece em cena. Em ambos os casos, a música, o ambiente e a forma como a sensação é passada ao espectador abre nossos olhos para as possibilidades que a acessibilidade traz.
É como Djamila Ribeiro, uma importante pensadora e ativista brasileira, se posiciona sobre a empatia. Para ela, empatia não é sobre saber me colocar no lugar do outro, porque eu nunca vou saber como é estar nesse lugar. Empatia é sobre saber como meu lugar impacta no lugar do outro.
Para Repensarmos Inclusão
Ainda no Blog Vencer Limites Luiza responde a perguntas com o auxílio de Naiane Olah, e algumas de suas respostas demonstram o que tentamos descrever neste artigo.
“A grande questão é que a acessibilidade raramente é pensada junto com a criação e desenvolvimento de um projeto. É pensada de forma secundária, depois que tudo está pronto e, dessa forma, fica fria e apenas cumprindo um papel de lei.
A acessibilidade tem que, primeiramente, ser entendida como algo fundamental, como parte do acesso à cultura e à arte para todos. A iniciativa deve ser humana, antes de qualquer coisa,” diz Luiza.
Pensar na acessibilidade como parte fundamental de qualquer projeto desde o início da ideia de sua criação é algo a ser levado em conta. Compartilhamos da opinião de que tornar os conteúdos digitais mais humanos é essencial. Valorizar as pessoas é o nosso foco.
Inclusive, o site oficial da Luiza Caspary, assim como o da SALUT Captions, é todo focado em acessibilidade. Possui tradução em libras, audiodescrição, ajustes de contraste e tamanho das fontes, teclas de atalho e navegação por tabulação em todo o conteúdo.
Mais uma vez, a equipe da SALUT Captions agradece imensamente pela oportunidade de fazer parte de um projeto tão incrível e sensível como o Doc Mergulho – Faixa a Faixa. Esperamos que este projeto alcance as pessoas da maneira como foi projetado: com amor, carinho e empatia.